Oceano resfria e acende alerta para La Niña Atlântica, que pode intensificar seca na Amazônia

Grande parte do oceano Atlântico Norte tem estado extremamente quente até agora neste ano, o que inclusive serve de combustível para uma temporada de furacões intensa no Caribe e Estados Unidos. Porém, desde o início de junho, a temperatura da superfície do mar no Atlântico próximo à linha do Equador tem sido de 0,5 a 1 °C mais fria do que a média para esta época do ano, explica a NOAA, agência americana para os oceanos e o clima.

Se as condições frias persistirem até o final de agosto, um fenômeno conhecido como “La Niña Atlântica” pode ser declarado. Assim como os conhecidos El Nino e La Niña, que atuam nas águas do Pacífico, os “primos” do oceano que se estende pelo litoral brasileiro também podem gerar efeitos amplos no clima.

A Niña Atlântica é a fase fria de um padrão climático natural, chamado de modo zonal Atlântico. Esse padrão, assim como os fenômenos similares do oceano Pacífico, oscila entre fases fria e quente a cada poucos anos.

“Será interessante monitorar se essa Niña do Atlântico se desenvolve completamente e, se sim, se tem um efeito de amortecimento na atividade de furacões conforme a temporada avança”, afirmam técnicos da NOAA.

Simultaneamente a este movimento no Atlântico, no oceano Pacífico espera-se o início de um período de La Niña entre setembro e novembro. O Centro de Previsão Climática dos Estados Unidos (CPC/NCEP) prevê um evento de de fraca intensidade. Caso este padrão climático se confirme, o Climatempo pontua que as regiões Norte e Nordeste do Brasil receberão mais chuvas do que o normal, tendência que vai na contramão da possível Niña Atlântica, e o Sul enfrentará mais momentos de seca.

Imagem térmica mostra o resfriamento do oceano Atlântico na altura da linha do Equador em 2024. À esquerda, o litoral do Nordeste brasileiro, em cinza. (Foto: NOAA/Divulgação)

Pressão sobre a Amazônia

A influência de uma Niña Atlântica poderia agravar o quadro de seca vivido pela Amazônia. Em 2005, período sob influência do fenômeno, mais de 700 mil quilômetros quadrados (70 milhões de campos de futebol) de floresta no sudoeste da Amazônia enfrentaram uma seca extensa e severa seca, com impacto estendido por anos, apontou a Nasa em estudo de 2013.

Embora os níveis de chuva tenham voltado ao normal nos anos seguintes à seca, os prejuízos continuaram durante a segunda grave seca que começou em 2010, apontaram cientistas. Esse “golpe duplo”, afirmava o artigo, já sugeria um efeito generalizado da mudança climática nas regiões sul e oeste da Amazônia, que hoje passam novamente por um período largo de rios com níveis baixos e incêndios intensos pela vegetação seca.

A Niña Atlântica demarca uma situação em que ocorrem menos nuvens sobre a floresta, o que poderia deixá-la ainda mais exposta às condições severas notadas em 2024. “O gradiente de temperatura aponta para o Hemisfério Norte (mais quente), deslocando a região preferencial de formação das nuvens mais ao norte de sua posição climatológica”, explica Renato Senna, pesquisador e coordenador de hidrologia do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia).

Gráfico da NOAA mostra anos de influência dos Niños do Atlântico. Em 2005, anos de seca forte na Amazônia, houve período de Niña Atlântica. (Foto: NOAA/Divulgação)

Como ocorre uma Niña Atlântica

Normalmente, as temperaturas da superfície do mar no Atlântico equatorial ficam mais quentes na primavera do Hemisfério Norte (outono no Brasil), enquanto as águas mais frias do ano (abaixo de 25 °C) ocorrem de julho a agosto.

Este resfriamento é causado por ventos que agem na superfície do oceano. Os sopros constantes do sudeste são fortes o suficiente para arrastar as águas da superfície para longe do Equador, o que traz água relativamente fria das camadas mais profundas do oceano para a superfície, afirmam pesquisadores.

Quando essa camada fria é substancialmente mais quente ou mais fria do que a média, esses eventos são chamados de “Niñas” (água mais fria que a média) e “Niños” do Atlântico (água mais quente que a média). Para haver essas classificações, é preciso exceder 0,5 °C em relação às médias do Atlântico, por pelo menos duas estações seguidas.

O que ocorre em 2024 chama atenção pela rápida mudança de cenário, afirma a NOAA. O ano começou com temperaturas extremamente quentes na superfície do mar no Atlântico equatorial durante fevereiro a março, passando os 30 °C. Foi o evento quente mais forte desde 1982. Ao mesmo tempo, nunca antes essa porção do oceano oscilou tão rapidamente de um evento extremo para outro.

Uma variação, para mais ou para menos, de 0,5°C influencia a redução da chuva na região do Sahel, que atravessa o norte africano, o aumento da precipitação no Golfo da Guiné e as mudanças sazonais da estação chuvosa no Nordeste do Brasil. Essas situações estão todas expostas à atuação dos “niños” atlânticos.

Fonte: Um Só Planeta

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