Dentes centenários de tubarões ajudam a revelar mistérios sobre o oceano brasileiro

Quando um condomínio ameaçou os restos de um local de pesca costeira do século 13 em Santa Catarina, em 1996, arqueólogos correram para escavar. Eles rapidamente coletaram o que puderam no sítio Rio do Meio – cerâmica, ferramentas, restos de animais. O local histórico agora fica sob uma popular propriedade à beira-mar. Felizmente, porém, os artefatos estão guardados em segurança no museu da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Muito antes dos condomínios, há cerca de 750 anos, os povos indígenas viajavam para esta área para pescar. Os tubarões eram uma parte importante de suas dietas e, após uma caçada bem-sucedida, os pescadores abatiam tubarões-touro, tubarões-brancos, tubarões-tigre e outras espécies no Rio do Meio antes de transportar a carne.

Para a sorte de Guilherme Burg Mayer, estudante de pós-graduação em ecologia pela UFSC, os caçadores deixaram para trás as cabeças decepadas dos tubarões. O acervo do museu universitário de Rio do Meio inclui dentes de pelo menos oito espécies diferentes – e os dentes de tubarão são um tesouro de informações.

O tubarão-recifal, espécie que perdeu 50% da população em águas brasileiras (Foto: Andy Mann/ Divulgação)

Em um artigo recente, Burg Mayer e os seus colegas compararam estes dentes escavados com dentes de tubarão modernos recolhidos na mesma região entre 1975 e 2010. Utilizando um método chamado análise de isótopos estáveis, que fornece informações sobre a dieta e o ambiente de um animal, a equipe identificou diferenças entre as duas dentições que provavelmente refletem como o ecossistema marinho da região mudou ao longo dos séculos e como os tubarões se adaptaram, explica a Smithsonian Magazine.

“Acho que muitas pessoas simplesmente pensam que os dentes de tubarão são coisas pontiagudas e triangulares”, diz Sora Kim, biogeoquímica de isótopos estáveis da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, que também estuda dentes de tubarão, mas não esteve envolvida na análise do Rio do Meio. Esta abordagem é relativamente nova, diz Kim, e os cientistas podem aprender muito com a forma e a química dos dentes dos tubarões.

Assim como os dentes humanos, os dentes de tubarão contêm colágeno, um tipo de proteína que inclui diferentes elementos, como nitrogênio e carbono, que os animais obtêm dos alimentos. Embora os cientistas não consigam dizer exatamente o que um animal comeu através da análise dos seus dentes, a equipe de Burg Mayer conseguiu recolher pistas sobre as dietas dos tubarões e a sua classificação como predadores.

Os investigadores descobriram que há séculos atrás diferentes tipos de tubarões alimentavam-se de animais que ocupavam o mesmo nível da cadeia alimentar – presas que viviam próximas umas das outras e comiam coisas semelhantes. Os ecologistas consideram este tipo de sobreposição de dietas uma coisa boa, diz Burg Mayer, porque aponta para uma rede alimentar mais resiliente, onde os predadores têm muitas presas diferentes para mastigar. Se um tipo de peixe saboroso desaparecer, por exemplo, os tubarões terão muitos outros para comer.

Em contraste, as dietas dos tubarões modernos do Brasil têm pouca sobreposição. Em vez disso, os tubarões parecem estar comendo presas que recebem pouca atenção de outros tubarões ou comendo uma combinação mais diversificada de presas de diferentes níveis da cadeia alimentar. Uma possível explicação para esta mudança, diz Burg Mayer, é que os tubarões se tornaram menos exigentes à medida que o número de espécies de peixes diminuiu, forçando-os a consumir novos alimentos. Para os investigadores, esta mudança sinaliza um ecossistema menos resiliente.

Fonte: Um Só Planeta

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