Antigamente se pensava que apenas os humanos sonhavam, mas a ciência já identificou que diversas espécies de animais também têm essa capacidade.
Em laboratório, aranhas saltadoras dormindo dentro de uma caixa curvaram suas pernas, contraíram suas fiandeiras e movimentaram as retinas. “O que estas aranhas fazem parece muito de perto com o sono REM”, diz Daniela Rößler, ecologista comportamental da Universidade de Konstanz, na Alemanha, à revista Knowable. Durante o sono REM (movimento rápido dos olhos), os olhos de um animal adormecido movem-se de forma imprevisível, entre outras características.
Nas pessoas, o REM é quando acontece a maioria dos sonhos, principalmente os mais vívidos. Se as aranhas têm sono REM, será que também sonham? Analisando 34 aranhas, a equipe de cientistas descobriu que os animais tinham breves períodos semelhantes a REM a cada 17 minutos. Rößler acredita que se o que parece ser REM de fato for, sonhar é uma possibilidade distinta. Como animais altamente visuais, as aranhas saltadoras poderiam se beneficiar dos sonhos como forma de processar as informações que captaram durante o dia.
Outros estudos também já encontraram sinais de sono REM em lagartos, ratos, pombas, peixes-zebra e chocos (moluscos marinhos).
Além dos movimentos rápidos dos olhos, o sono REM é caracterizado por paralisia temporária dos músculos esqueléticos, espasmos corporais periódicos e aumento da atividade cerebral, respiração e frequência cardíaca. Observado em bebês em 1953, o REM logo foi identificado em outros mamíferos, como gatos, ratos, cavalos, ovelhas, gambás e tatus. Mesmo entre eles, porém, o sono REM não é igual. As equidnas (parecidas com ouriços) apresentam características de sono REM e não REM ao mesmo tempo. Baleias e golfinhos podem nem ter experiência REM. Os pássaros têm sono REM, que vem com espasmos no bico e nas asas e perda de tônus nos músculos que sustentam suas cabeças.
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Um estudo de 2012 identificou que os chocos, durante o sono REM, moviam os olhos rapidamente, contraíam os braços e alteravam a coloração de seus corpos a cada 30 minutos. Desde então, pesquisadores observaram um estado semelhante em polvos. Se os polvos e os chocos sonham, “isso simplesmente derruba as paredes daquilo que pensamos sobre a humanidade ser tão especial”, diz Teresa Iglesias, bióloga comportamental que investigou o fenômeno, quando fez seu estudo no Laboratório de Biologia Marinha em Woods Hole, Massachusetts.
Observando múltiplos estágios do sono em um parente evolutivamente distante dos humanos, cientistas sugeriram que diferentes tipos de sono surgiram há centenas de milhões de anos. Eles consideram a possibilidade de animais não humanos sonharem durante o sono tipo REM porque as criaturas apresentam comportamentos semelhantes aos da vigília neste estado, como o piscar dos padrões dos cefalópodes ou o tremor das fieiras das aranhas.
Em pombos, a equipe da cientista do sono Gianina Ungurean, do Instituto Max Planck de Inteligência Biológica em Munique e da Universidade de Medicina de Göttingen, observou que as pupilas se contraem durante o REM, assim como acontece durante o comportamento de cortejo, o que levanta a questão de saber se os pombos estão sonhando ou de alguma forma revivendo o que aconteceu durante os momentos de namoro acordados.
O sono REM também tem sido associado à repetição de experiências em alguns animais, como quando os cientistas registraram a atividade elétrica cerebral de ratos adormecidos que tinham percorrido um labirinto, observando o disparo de neurônios que ajudam na navegação e que estão associados ao movimento ocular. A combinação sugere que os ratos podem ter tido uma experiência onírica em que examinavam o ambiente, diz Ungurean, acrescentando que com todos esses sinais, é justo postular que os animais podem estar sonhando.
“No entanto, se considerarmos essas razões uma por uma, verifica-se que nenhuma delas é suficiente.” A atividade cerebral associada à repetição, como a dos ratos que correm no labirinto, não ocorre apenas durante o sono REM ou durante o sono, mas também durante o planejamento ou devaneio. A ligação entre REM e sonho não é absoluta: os humanos também sonham em períodos não-REM, e quando usaram remédios para suprimir o sono REM, os participantes humanos do estudo ainda tiveram sonhos longos e bizarros.
As pessoas sabem que estão sonhando porque podem relatar isso, diz Ungurean, “mas os animais não podem reportar, e este é o maior problema que temos em estabelecer isso de forma puramente científica e robusta”. As ideias mais aceitas sobre as funções do sono REM afirmam que ele ajuda o cérebro a formar e reorganizar memórias, apoia o desenvolvimento do cérebro, ajuda no desenvolvimento dos sistemas de movimento do corpo, mantém os circuitos necessários para as atividades de vigília, para que não se degradem durante o sono, e aumenta a temperatura do cérebro.
Nem todos os cientistas, porém, acreditam que os pesquisadores estejam vendo o REM. Para Jerome Siegel, neurocientista que estuda o sono na Universidade da Califórnia, eles podem apenas estar cumprindo noções preconcebidas de que todos os animais têm dois estados de sono e interpretando um deles como REM. Alguns animais, como as aranhas saltadoras, podem nem estar dormindo. “Os animais podem fazer coisas que parecem iguais, mas a fisiologia não é necessariamente a mesma”, diz ele.
Continuamente em busca de pistas, a equipe de Rößler está tentando desenvolver manchas que lhes permitam visualizar cérebros de aranhas, o que pode revelar a ativação em áreas que são funcionalmente análogas àquelas que usamos quando sonhamos. Iglesias e outros implantaram eletrodos nos cérebros dos cefalópodes e capturaram sua atividade elétrica durante dois estados de sono: um que mostra atividade semelhante à da vigília e outro que mostra um estado silencioso, com assinaturas neurais semelhantes às observadas em mamíferos. Ungurean treinou pombos para dormir em uma máquina de ressonância magnética e descobriu que muitas das áreas do cérebro que se iluminam no sono REM humano também são ativadas em pássaros.
Fonte: Um Só Planeta